O MINUSCULO INDESEJAVEL - Mariana Cruz

Todo mundo sabe quem é o culpado: um mosquitinho. Qual é a causa: água parada e limpa. E quais os sintomas: corpo mole, febre alta, dor nos ossos e articulações, na cabeça, atrás dos olhos, náuseas, vômitos, perda de apetite, fadiga. Não é preciso ser um virologista renomado para saber que tais características se referem à dengue. Se todo mundo já está cansado, dolorido e nauseado de conhecer a doença, resta a questão: por que de tempos em tempos a epidemia da dengue volta a assombrar? A resposta parece clara: cidadãos e autoridades consideram que o problema vai embora junto com a época das chuvas. Esquecem-se, porém, de que a dengue vai... e volta no próximo verão. Mas enquanto ela não chega, os preparativos para receber os ovos do mosquitinho continuam sendo cultivados em pneus abandonados a céu aberto, calhas cheias de folhas, depósitos d’água destampados, pocinhas nos pratos de plantas, bromélias adornando os jardins...

Para quem não sabe, a dengue é velha conhecida nossa; desde os tempos de colônia ela já rondava por aqui. O mosquito transmissor da dengue tem origem africana, oriundo da região etiópica e originalmente descrito no Egito, daí o nome Aedes aegypti. O mosquito tem se mostrado um fiel companheiro do homem em sua permanente migração, tendo aportado no Brasil junto com os navios negreiros.
O primeiro caso da doença foi registrado em 1685, em Recife (PE). Em 1692, a dengue provocou 2 mil mortes em Salvador (BA), reaparecendo em novo surto em 1792.
Em 1846, uma epidemia de dengue atingiu Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador, tornando o mosquito nacionalmente conhecido. Entre 1851 e 1853 e em 1916, São Paulo foi atingida por epidemias da doença. Em 1923, foi a vez de Niterói, no Estado do Rio, lutar contra uma epidemia em sua região oceânica.
Em 1903, o diretor geral da Saúde Pública, Oswaldo Cruz, implantou um programa de combate ao mosquito. Em 1957, foi anunciada a erradicação da doença no Brasil. Alarme falso: os casos continuaram ocorrendo até 1982, quando houve uma epidemia em Roraima.
Em 1986, foram registradas epidemias no Rio de Janeiro, Alagoas e Ceará. Nos anos posteriores, a epidemia se alastrou por outros estados.
O Rio de Janeiro sofreu duas grandes epidemias. Uma, em 1986-87, com cerca de 90 mil casos; e a segunda, em 1990-91, com aproximadamente 100 mil casos confirmados.
Como se pode ver, do Brasil Colônia ao século XXI a dengue continua dando trabalho. Nos primeiros nove meses de 2007, foram registrados 481.316 casos e 121 mortes, o que representa aumento de mais de 50% em relação ao mesmo período de 2006. O Ministério da Saúde considera uma epidemia 300 infecções por grupo de 100 mil habitantes. Apesar de o índice do país todo neste ano ser de 253, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, já afirmou que o Brasil "vive uma epidemia".
Neste novo surto de dengue, o triste ranking nacional dos estados com maior incidência tem o Mato Grosso do Sul em primeiro lugar, com 72 mil casos. Na segunda posição está São Paulo, com 64 mil, seguido do Rio de Janeiro, com 51 mil; depois vem o Paraná, com 45 mil, e o Ceará, com 36 mil casos de dengue registrados. As 108 cidades que lideravam a lista de dengue em seus estados, também não têm nada do que se orgulhar, todas já haviam sido alertadas sobre o risco de epidemia no final de 2006; 53 delas não tomaram as devidas providências e hoje continuam no topo da lista.
O combate à dengue deve ser feito pelas três esferas de governo: Ministério da Saúde e Secretarias de Saúde do estado e dos municípios. Aos dois primeiros cabe financiar as ações, orientar e fiscalizar. O último tem o dever de executar as atividades, em sua maioria voltadas para obras de infra-estrutura, como saneamento e fornecimento de água constante. Sem tais medidas de prevenção, as chuvas é que ficam no comando da epidemia: quanto mais chove, mais pessoas são contaminadas.
As últimas epidemias vêm com novidades: agora, o mosquito – outrora inimigo das localidades frias – tem se expandido para a Região Sul do País. Uma causa disso podem ser as mudanças climáticas e o aumento do descarte de garrafas PET entre outros fatores.
Além das dificuldades médico-assistenciais e da falta de colaboração do público, outro fator se adiciona ao crescimento da dengue no país, em determinados lugares: em Fortaleza, por exemplo, há bairros inteiros com focos permanentes de irradiação da doença, devido à dificuldade de acesso dos agentes sanitários às residências por conta do clima de insegurança. Além disso, faltam campanhas de esclarecimento, lideradas por autoridades públicas, incluindo preparação dos moradores para as visitas domiciliares, que devem contar com apoio da força policial a fim de evitar assaltos às residências.
Tipos de vírus causadores da dengue
A dengue pode ser transmitida por duas espécies de mosquitos: Aedes aegypti e Aedes albopictus. O primeiro é o principal disseminador. Trata-se de um mosquito ágil, que pica com facilidade em horários diurnos, com predominância ao amanhecer e próximo ao crepúsculo vespertino. A fêmea consegue picar diversos hospedeiros para conseguir alimentação suficiente – essencial para o desenvolvimento dos ovos. Caso as fêmeas de Aedes aegypti estejam infectadas, disseminarão o vírus da dengue ou da febre amarela entre todas as pessoas picadas. É, o Aedes aegypti também pode transmitir a febre amarela!
Os ovos dos transmissores de dengue, principalmente o Aedes aegypti, são fixados acima do nível da água e resistem longos períodos de dessecação (até 2 anos), facilitando a dispersão passiva.
O vírus da dengue é um membro da família Flaviviridae, a mesma dos vírus da encefalite, da febre amarela e da hepatite C. Como a maioria dos flavírus, o vírus da dengue é transmitido aos vertebrados por mosquitos cronicamente infectados. Existem quatro tipos diferentes de vírus da dengue: 1, 2, 3 e 4.
Normalmente, dez dias após a transmissão a pessoa infectada se recupera e fica imunizada contra o tipo de vírus (1, 2, 3 ou 4) que causou a doença. Mas pode ser infectada pelos demais tipos de vírus da dengue. Inclusive a dengue hemorrágica, que é a forma mais grave da doença. Ela ocorre quando, mais ou menos três dias após a febre ceder, há uma diminuição acentuada da pressão sangüínea. A forma hemorrágica pode levar o indivíduo à morte; e é possível que ocorra mesmo em quem tem a doença pela primeira vez.
Para identificar o mosquito transmissor da dengue é importante saber algumas de suas características:

Mede entre 5 e 7 mm
Tem corpo escuro
Possui anéis dourados nos segmentos abdominais
Tem desenho dourado na parte superior do tórax
Tem anéis prateados nas articulações das patas
Apesar de todos os esforços governamentais, a principal arma contra a doença ainda é a conscientização da população. É muito importante que as pessoas sigam as orientações dos profissionais da área para evitar a contaminação.

Agora chega de teoria, dados, estatísticas e história. Mãos à obra. Aqui está uma série de dicas sobre o que cada um deve fazer para evitar a proliferação de mosquito. Além de tomar seus cuidados, você pode disseminar estas atitudes com seus colegas e alunos.
lavar as vasilhas de água dos seus animais pelo menos uma vez por semana com bucha, sabão e água corrente;
verificar se todos os ralos de casa estão desentupidos; deixe fechados os que estiverem fora de uso;
retirar a água da bandeja externa da geladeira e lavar com sabão;
lavar bem o suporte de garrafões de água mineral na hora da troca;
manter fechada a tampa dos vasos sanitários;
lavar tonéis, depósitos de água, poços artesianos, caixas d’água, barris, cisternas com bucha e sabão, mantendo-os fechados com tampa ou com uma tela;
colocar a areia em muros protegidos com cacos de vidro para evitar que acumulem água;
tratar com cloro a água da piscina, que deve ser limpa uma vez por semana. Se não for usá-la, mantê-la coberta. Caso esteja vazia, colocar 1 kg de sal no ponto mais raso;
fechar bem os sacos plásticos e manter as lixeiras tampadas;
entregar os pneus velhos ao serviço de limpeza urbana ou guardá-los em local coberto;
manter garrafas, latas e vidros bem fechados, para que não acumulem água, além de guardá-los de cabeça para baixo (baldes também);
colocar areia nos pratinhos dos vasos de planta ou xaxins, evitar plantas que acumulam água, como bromélias; caso faça questão de tê-las, regá-las com uma mistura de 1 litro de água + uma colher de água sanitária;
Retirar as folhas e tudo que impede a água de correr por calhas de água de chuva;
Retirar a água acumulada das lajes;
transferir plantas aquáticas para vasos de terra.

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